Sobre o verdadeiro pecado!

Sobre o verdadeiro pecado!
"O primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida." Carl Sagan

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Gestora do Universo

Em determinados períodos da vida da gente uma vontade incrível de estar no lugar do Regente do Universo nos acomete. Vontade de ser Deus. Afinal, certas ocorrências da vida nos desagradam, porque não somos nós que estamos guiando. A perda de um amigo nessa semana me feriu e me fez pensar em como seria bom poder comandar com minhas rédeas a existência humana.
Todavia, se eu fosse Deus minhas diretrizes iriam magoar muitas pessoas, afinal não se pode agradar à todos. Da mesma forma se você fosse Deus. Mas, se eu estivesse em seu lugar não teria levado meu amigo que estava na flor da idade, se estabilizando financeiramente, com uma namorada amável e linda, cheio de sonhos para o futuro.
Eu também não teria levado a menina Isabela que provavelmente foi assassinada pela madrasta problemática e pelo pai truculento. Eu levaria os covardes, os viciados em qualquer substância entorpecente, porque não conseguem ver graça na vida, porque são infelizes. Na verdade, eu levaria todos os que tendo saúde, força e trabalho, vivem desgostosos da vida.
Levaria os que são amados e não conseguem amar à vida, à si mesmos e tampouco outra pessoa.Levaria as sementes mal plantadas que já nascem com cara de abordadas, as pessoas que tem alma pequena, e vivem remoendo pequenos problemas, os que vêem a luz sem deixa-lá iluminar suas minicertezas, os que vivem querendo o que não tem, como disse Cazuza. Carregaria para outra dimensão os infelizes. Eu não seria um Deus mau- eu daria aos homens o que eles querem. Vida para quem quer e morte para quem deseja fugir e não consegue seu intento.
Infelizes porque não se ajudam, porque não aprenderam a valorizar o que tem e vivem lamentando o que ainda não possuem. Os que tem bons amigos, os que são amados por alguém e não vêem nada, sequer o amor que recebem. Eu deixaria gozar um pouco a vida na companhia de quem lhes ama os que são contentes nesse mundo, que apesar de não serem ricos, lindos e famosos tem o coração pulsando pela vida, cheio de alegria e ânimo.
No meu reinado como gestora do Universo pessoas lamentosas e infelizes não teriam vez. Eu anteciparia seu fim. Não acha graça na vida, meu filho? Esta procurando a morte com vícios, entorpecentes, promiscuidade, direção perigosa? Esta lamentando a vida que tem? Então, diga "tchau". A vida é para ser bem vivida, é feita para os bon vivants.
Cláudia de Marchi
Passo Fundo, 17 de abril de 2008.
Os cidadãos que residem na cidade em que moro, Marau/RS, podem ler este texto adaptado para publicação (com cortes, menor) no Jornal Folha Marauense na edição que circulou no dia 24/04/08. Sou cronista com participação quinzenal nas publicações do periódico.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Parque de diversões

Parque de diversões

"Assim eu não brinco mais". Duvido adulto que, quando criança não tenha dito essa frase ou, ao menos não tenha ouvido de alguma. Quando a brincadeira não esta mais agradando, ou melhor, quando por um motivo ou outro a criança se sente prejudicada na brincadeira, porque ela não esta "andando" como ela quer ela faz seu protesto. Da mesma "família" de frases infantis-protesto é "se tu fizer isso não serei mais seu amigo".
Todavia nós crescemos, e criamos uma noção bem errada do que é ser mimado. Como filha única sempre me tacharam de "mimada". De fato, sempre tive o que eu desejava, porém meus pais sempre me colocaram a par do mundo dos adultos, de forma que, com 14 anos os papos adolescentes me davam náusea enquanto o das minhas tias balzaquianas me davam calor tamanha a empolgação e meu interesse neles.
E, graças as minhas experiências, mudança de cidade, escolas, cursos, aprendizado aferido da observação de experiências alheias (dos mais velhos, inclusive), aprendi que grande parte dos acontecimentos na vida da gente independem de nossa vontade consciente, e, obviamente, nem tudo acontece como desejamos, sendo que, via de regra, quem espera demais, acaba por se frustrar na mesma intensidade. Assim, deixei de introjetar o "mimada" e não me sinto mais de tal forma. No mundo dos adultos, não existe o "não brinco mais". As casinhas não são de bonecas, a comida não é de "faz de conta", as panelas não são de plástico, nem as paredes de lona construídas embaixo de galhos de árvore.
Os relacionamentos são sérios. A gente assume compromisso com os sentimentos próprios e com os alheios, não existe "assim não brinco mais com você", tampouco "assim não sou mais seu amigo". No mundo dos adultos a falsidade existe, a deslealdade, a infidelidade. Conquistamos amigos eternos, fizemos inimigos mesmo sem saber que os temos, despertamos os mais diversos sentimentos sem termos ciência de quem os sente. Na vida adulta as circunstâncias, os relacionamentos, os empreendimentos, não são desmanchados com atitudes birrentas, com um beicinho ou com um "mamãe olha o que ele me fez".
Aqui, meus caros, nós temos responsabilidade não apenas pelo que escrevemos, mas pelas palavras ditas, pelas atitudes tomadas, pelos sentimentos que despertamos, pela confiança que nos impõem, pelas expectativas que temos e, também, pelas que criamos em que nos preza. Infelizmente, porém, existem pessoas que se ferem por não ter algum retorno do que espera ou, simplesmente, porque a vida não esta andando da forma esperada e desejada, assim, emburrados e feridos, acabam criando uma aura de descontentamento que, ao invés de findar, acaba atraindo mais situações de desagrado como um círculo vicioso lamentável e de lástimas.
Não adianta não querer mais brincar nesse imenso parque de diversões que é a vida adulta. A gente tem que aproveita-lo, rir do que é engraçado, rir também quando sentimos frio na barriga, chorar quando nos sentimos amedrontados ou pequenos diante das surpresas, afinal, nesse parque nossa vontade é muito, mas não é tudo. O interessante é curti-lo sabendo que nem sempre sentiremos prazer, nem sempre as coisas darão certo, nem sempre seremos vitoriosos em nossos empreendimentos, mas que, a coragem é fundamental porque desse parque ninguém pode fugir pela sua própria vontade, ao menos que seja, isto sim, mimado e covarde demais para desistir porque não conseguiu perceber que, nesse parque a roda gigante chamada trajetória humana não anda da velocidade, tampouco da forma que podemos desejar.

Cláudia de Marchi

Passo Fundo, 09 de janeiro de 2008.

Recordações


Recordações

Tudo o que é bom, sentimentos, vivências, momentos enfim, se eternizam em nossa memória, assim como nós mesmos nos tornaremos eternos pelo bem que fizemos na vida dos outros. O que é ruim devemos tentar esquecer, ou ao menos, afastar de nossa mente porque as lembranças nos fazem reviver sensações e das más nunca é bom recordar, pelo contrário, em relação as boas lembranças. Como é bom reprisar na memória e sentir no bater do coração e no arrepio na pele as boas sensações que, às vezes, quando vivenciamos o momento agora lembrado, não achávamos que, futuramente, iríamos recordar com tanta ternura e boa inspiração.
Véspera de aniversário sempre me faz recordar. Me lembro dos aniversários passados e, principalmente, do que aconteceu entre um "festejar anos" e outro e me fez ser o que sou hoje. Experiências, mudanças, amores, separações, uniões, rompimentos, risos, lágrimas, expectativas, frustrações. Independente do resultado de cada empreendimento, tanto profissional quanto afetivo, é o caminho entre um fato e outro, entre uma busca e outra, entre um encontrar e outro que me faz sorrir e sentir ternura pelo que fui, pelo que fiz, por quem convivi e estimei, pelas pessoas que hoje ou no passado, foram importantes em minha vida e na minha memória se eternizaram
Outro dia me lembrei de uma manha que tive há alguns anos atrás. Juntamente, ou melhor, após degustar um belo café da manha eu comi um quindim. Lembrar daquele momento, da alegria que sentia, da paz, da tranqüilidade, me fez sentir na boca o gostoso gosto do doce. Menos madura, menos experiente, menos centrada na carreira, mas, sempre, muito entusiasmada, afinal sou o tipo de pessoa que goza a vida com certa intensidade. Não tenho meio termo quando o assunto é lealdade aos meus sentimentos. Não sei meio gostar, meio amar, meio odiar. Amo muito, odeio com a mesma intensidade. Todavia, prefiro esquecer, deletar com convicção do que guardar rancor, mas, se for para desprezar, desprezo com asco com "a" maiúsculo.
Mas, da vida, o bom mesmo é gozar o que é bom. É guardar no coração e na memória as palavras de amor que ouvimos, a mão que nos estendem, o abraço forte na hora em que nos sentimos desamparados, o afago, o carinho, a viagem, as risadas, os jantares com pessoas queridas, as doces sobremesas, o bom "breakfest" com quindim ou sem, mas tranquilo, em paz, dos momentos em que pensávamos "é isso que quero para mim" mesmo que a opinião tenha mudado ao longo do caminho. Naquele momento estávamos bem, sendo leais aos sentimentos que tínhamos que, podem muito bem terem mudado, assim como nós mudamos no decorrer da estrada da vida. O que vale, pois é a trajetória e não o fim do caminho, podemos mudar de rota mas jamais esqueceremos da viagem que fizemos.
E, assim, mais do que nunca eu percebo como é bom viver intensamente os pequenos momentos da vida para, quando dela sairmos, tenhamos na mente eternizados os momentos de alegria, felicidade e amor que vivenciamos. Viver procurando algo, metas grandiosas, pode ser perigoso se nos esquecermos de viver o hoje, os momentos que, ainda que pareçam singelos, poderão ser aqueles que, recordados no amanha, nos farão sorrir de alegria e orgulho por termos sentido sentimentos bons e alegres, por termos, enfim, "bem vivido".

Cláudia de Marchi

Passo Fundo, 09 de abril de 2008
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Ciclo estúpido

Ciclo estúpido

Estupidez, grosseria, quem gosta? Duvido que alguém de uma afirmativa positiva. Ninguém gosta de ser respondido com estupidez, ninguém gosta de falas grosseiras e bruscas, todavia, mesmo quando todos falam que desejam respeito e que querem ser tratados dignamente não é maioria que respeita, e trata trata os outros com consideração quando esta se sentindo mal consigo ou com algum problema causando preocupações.
E é por isso que a raiva e o mal humor criam ciclos. O marido é grosseiro com a esposa que fica furiosa e descarrega no filho que chega na escola e acaba puxando briga com o coleguinha franzino, que, por sua vez ao sair do colégio descarrega a raiva na irmãzinha que, por ter apenas três anos de idade chora e importuna os pais ate dormir, irritando a mãe que acaba sendo grosseira com o marido lhe negando atenção e reclamando do que não deve. Bem, neste caso o ciclo parou numa discussão de casal, poderia acabar numa briga mais séria que, como estopim, fomenta uma separação, em outros casos o ciclo pode terminar num crime, em algo mais sério, enfim.
Ninguém é saco de pancada de ninguém, ou existe alguém que goste ou queira ser um? Existe alguém no mundo que queira ouvir grosserias, respostas estúpidas ou brutas? Creio que não. O cerne da vida em sociedade é que não se deve fazer ou falar ao outro o que não se deseja para si, e, também, o que não se queira ouvir. Não custa nada aprender a ser realmente racional na hora de agir e pensar que no corpo do outro também existe uma mente cansada, que trabalha, se incomoda, se dedica, se empenha e um coração que não deseja ser mal tratado por coisas que não deu causa e sequer sabe.
Fazer a raiva, a cólera interna proveniente de motivos que, de repente, sequer dizem respeito ao outro, gerar uma briga graças a uma palavra estúpida, literalmente mal dita, é o maior sinal de falta de razão do ser humano, é, pois um ato irracional. Todos tem o direito de sentir raiva, já diria Shakespeare, mas ninguém tem, junto com ele tem o direito de ser cruel com os outros.
Esta irado, furioso? Vá na frente do espelho e fale palavrões para si mesmo. Quer ir falar com quem lhe causou a ira? Ótimo, melhor descarregar a fúria em quem a causou do que naquele não tem nada haver com o problema e que, muitas vezes, deseja apenas o bem. Quer bater em alguém tamanho o ódio que esta sentindo? Bata em si mesmo ou compre um saco de areia para bater. Vá na academia, corra, descarregue as energias. Tome um banho, faça sexo, coma chocolate, beba algo que goste, saia para jantar. Faça qualquer coisa mas não seja injusto com quem não deve, porque, fazendo injustiças, sendo grosseiro ou estúpido com alguém, o outro estará sendo bem justo se um dia cansar de você.
Existem sempre formas mais inteligentes de se desvencilhar de um problema ao invés de criar outro magoando quem tem apreço por você. Roupa suja se lava em casa, dizem alguns. Na verdade roupa suja pode ser lavada na casa de quem a sujou, ou, se a intenção for perder a razão que a roupa seja lavada com a saliva ou lágrimas do outro, desde que este tenha sido quem a fez sujar e não alguém que nada fez e que, muitas vezes, acaba ouvindo grosserias sem saber porque. Direito de sentir raiva, de ter um dia de mau humor, todos temos, o que não podemos é ferir alguém que não tem nada haver com nossa crise interior que, se for realmente grande se resolve pagando um bom psicólogo, psiquiatra ou um grande, redondo e vermelho saco de pancadas.

Cláudia de Marchi

Passo Fundo, 09 de abril de 2008.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Viver e deixar viver.

Viver e deixar viver.

Eu queria fazer uma proposta para o mundo erguendo uma bandeira onde estivessem escritas em letras garrafais as palavras liberdade, respeito e sinceridade. Por outro lado queimaria outra com as palavras hipocrisia, moralismo e falsidade. A maioria da sociedade, no fundo, não iria simpatizar com minha atitude vândala, criticaria quem e o que se o moralismo e a falsidade virassem cinzas e a vida alheia fosse respeitada?
As coisas mudam. A sociedade muda. Os moralistas se erigem contra praticamente todas as mudanças radicais da atualidade. Homossexuais vivem em união estável, querem ter direito a se casar, a adotar filhos, novelas retratam nova forma de constituição de família no estilo “Dona Flor”, os tabus, enfim, estão virando piada. A liberdade cresce, a libertinagem também. Mas, e daí?
O que realmente fica lesionado nesse mundo mais liberto em que a hipocrisia, ao menos no que diz respeito a sexo e afeto, vem diminuindo? Quais são os “valores” que estão sendo feridos, na verdade? E, enfim, qual a validade desses valores para o mundo enquanto um local de coexistência de seres diferentes?
Posso responder tudo, ou nada para a primeira pergunta. E uma direta afirmativa para a terceira: Nenhuma. Para as pessoas que se escondem por trás de preconceitos, “princípios” de ordem moralista fajuta, há “todos” respondendo à segunda pergunta. Para os que vêem o mundo como um local em que a verdade e a liberdade devem predominar, sem dúvida não se poderá vislumbrar mácula à nenhum “valor”.
Lealdade. Honestidade. Sinceridade. Verdade. Respeito. Esses são valores. Pudor, conservadorismo? Não, não são valores. O desejar que todos sejam heterossexuais e vivam da forma com que a maioria vive é querer cercear a liberdade dos que – por motivos individuais que não se deve perscrutar aqui - pensam e sentem de forma diferente. É ferir um principio fundamental da vida em sociedade, mais do que isso, um principio cristão: O respeito, o não fazer ao outro o que não se deseja para si.
Sempre digo que a única forma de amar ao próximo é através do respeito. Aceitar as diferenças. Viver e deixar viver deveria ser o lema, o valor básico de toda sociedade politizada. Sexo a um, sexo entre iguais, entre diferentes, sexo a três, amor a quatro, cinco, ou dois é uma questão pessoal. Errado é trair a confiança, os sentimentos alheios.
Errado é cometer fraudes, é lesar ao próximo, é ser desleal. Cada um vive como quer e deve deixar os outros exercerem seu direito de ser livre. Deixem os outros se embriagarem, cometerem as orgias que quiserem, falar as besteiras que desejarem. Deixem os outros serem felizes se não estão traindo a confiança de ninguém, se estão, enfim, apenas vivendo suas vidas. Cada um, sempre, na sua, com alguma coisa em comum: O desejo pela felicidade, bem estar, bem viver. Cada qual, obviamente, da sua forma.

Cláudia de Marchi

Marau, 03 de abril de 2008.