Sobre o verdadeiro pecado!

Sobre o verdadeiro pecado!
"O primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida." Carl Sagan

sábado, 31 de março de 2007

Às palavras.

Às palavras.

Eis-me aqui, novamente, fazendo uso de vocês, palavras! Certa estava aquela que me disse perceber em meus escritos que vocês são minhas melhores amigas. Sem dúvida, vocês são e, quiçá, sempre serão.
Vocês, minhas palavras, não me traem, não me acusam, não me julgam. Vocês não são injustas, egoístas, não manifestam desamor, não complicam minha vida, não me fazem chorar ou atordoam meu coração tão cheio de boas intenções. Pelo contrário, quem as conhece bem como eu, sabe que vocês são as maiores esclarecedoras desta vida. Sem vocês nada fica claro, nada se concretiza.
Com vocês eu viajo - viajo para o mundo de meus pensamentos, de meus desejos, de meus anseios de amor e de meu coração que o transborda! Eis aí a palavra mais bela palavra dentre vocês: amor. Palavra tão forte que até assusta aos desavisados - aos que não sabem da importância de utilizá-la, além de lhe sentir.
Dessas viagens eu volto mais leve, volto um pouco mais em paz e me sentindo menos só. Vocês, minhas palavras, ajudam-me a me compreender e a entender ao mundo, porque na medida em que escrevo me descubro através de vocês.
Descobrir significa tirar algo que nos tapa, talvez tirar dos olhos o véu das pseudo-certezas, o véu da falta de compreensão alheia e própria, porque antes de usá-las eu vivo, eu sinto, eu sofro, me sinto só, me sinto perdida e, muitas vezes, sem sentir que dou amor e valorizo quem merece a intensidade com que sinto.
Sim, porque eu amo intensamente, da mesma forma com que vivo e me dedico a tudo que empreendo. Intensidade, eis outra bela palavra dentre vocês, mais linda do que aquela chamada “tempo”. Intensidade e amor fazem juntos um belo par. Não é aquele apregoado importante que coloquei envolto em aspas que cura tudo, que faz “somar” sentimentos: é o amor.
Amor a si mesmo, amor a vida, amor ao outro, mas, se é para amar que seja intensamente. O amor e a intensidade são parceiros do bom viver. Vive bem quem curte intensamente a vida porque ama viver, relações, romances, viagens e sentimentos não são bem calculados pelo longo ou curto tempo que duraram, mas pela intensidade com que foram vividos. Só quem ama, porém, sabe ser intenso.
Mas, o amor e a intensidade também chamam a responsabilidade - somos responsáveis pelo que cativamos, daí não ser certo exagerar nas “doses” que a vida oferece, afinal é preciso ser racional. É a responsabilidade por si mesmo e pelos sentimentos alheios que faz forte a realidade de que não podemos fazer aos outros o que não desejamos que eles nos façam.
Quando perdida, vocês me ajudam a chegar um pouco mais perto de mim. Quando me sinto sozinha ou carente, vocês aliviam o meu pesar e me fazem descobrir que é no meu amor próprio e utilizando de vocês que posso me sentir melhor.
Na minha casa, em casas alheias, em outras cidades, em meio a turbulências, são vocês, queridas palavras, que me levam para longe da insanidade, que me aproximam da razão, e não me deixam desviar do caminho do amor e da fé. Obrigada minhas melhores, minhas mais fortes e perfeitas companheiras.
(Gratidão, eis outra dentre vós que apenas quem ama sabe sentir. O egoísta (palavra necessária para descrever sentimento tão pérfido) não é grato à nada, nem a ninguém. Ele apenas consegue viver bem quando as pessoas não falam o que não deseja ouvir nem fazem o que não espera. Ele não sabe ser grato, nem ao amor, nem ao aprendizado que a vida poderia lhe dar se tirasse dos olhos de sua alma o véu negro que possui.)

Cláudia de Marchi

Marau/RS, 11 de março de 2007.

quinta-feira, 29 de março de 2007

Os riscos das ditaduras

Os riscos das ditaduras

Logo cedo recebi um e-mail com um discurso do Senador Antonio Carlos Magalhães que subentendia seu pleno apoio (e necessidade de reciprocidade dele) à efetivação de um golpe militar. Não vivi a época da ditadura, mas as notícias que recebi dela não foram das melhores, ou, ainda que fossem, pessoalmente não aceito a formação de um Estado justo sem liberdade de expressão.
Muitos, porém, acreditam que a ditadura militar trouxe organização à pátria brasileira, existia menos desordem, criminalidade inferior a existente hoje, e, assim, argumentam que "aqueles foram bons tempos". Melancolia tola, desconhecimento jurídico e cultural- eis a realidade existente por baixo de tal forma de analisar um período de tantas restrições aos cidadãos de bem.
Obviamente há mais de 20 anos atrás a criminalidade era inferior a existente hoje em dia, até mesmo porque o nível populacional era menor. Contudo, a semente da desigualdade social, das injustiças sociais estão plantadas neste País há mais de 500 anos atrás, e os prejuízos que hoje são verificados nada mais são do que uma decorrência lógica de uma série de fatores preexistentes a democracia e ao Estado Democrático de Direito.
Infelizmente, muitos parentes meus que não tiveram a possibilidade de estudar, de ler, enfim, e sempre acharam correta a Ditadura que vigorou no País. Eram pessoas que pouco refletiam vez que entretidas em seus trabalhos braçais. Quem não pensa, não questiona, e quem não questiona não sente a necessidade de liberdade, tampouco de se expressar, de arte, de cultura. Como bois, algumas pessoas trabalham de cabeça baixa, sem olhar adiante ou mudar de rumo, não indagam, não refletem.
Por outro lado, muitos foram os intelectuais, jornalistas, escritores que foram exilados, muitos foram os "desaparecidos", os esquecidos pela maior parte da nação. Não muito diferente nos outros países da América Latina, e em todos os locais em que as pessoas tiveram suas liberdades fundamentais restritas.
Onde os governantes queriam ordenar um rebanho e não uma nação de seres pensantes, porém, como diria a letra da música "Disparada": "boi a gente tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente". E sim, é muito diferente. Pessoas pensam e devem pensar, questionar, lutar, se manifestar, porém mesmo podendo não fizemos porque, ainda num Estado Democrático o povo vive sob uma espécie de ditadura.
As ditaduras da mídia, do consumismo, da futilidade, da ode a bunda e aos peitos, do cultivo das aparências ordenam que o povo assista novelas, acredite em tudo que ouve, gaste seu salário no final do mês, transe muito e pense pouco, valorize mais a bunda da Juliana Paes do que a mente da Lya Luft, mais o "gatão" da novela do que o sarcasmo picante do jornalista audacioso e as poesias do Vinicius. E, assim a nação vive sem questionar. Porém, nada é tão ruim que não possa piorar, e pior que isso é a implantação de uma ditadura militar. (Caso um dia isso acontecer, faço questão de sumir, ou ser uma desaparecida, porém pensante.)

Cláudia de Marchi 

Passo Fundo/RS, 21 de junho de 2006.

Nada como um dia depois do outro (e uma noite no meio).

Nada como um dia depois do outro (e uma noite no meio).

Nada como um dia após o outro. Nada como um dia depois do outro para “aquela pessoa” se arrepender da própria estupidez, nada como um dia depois do outro para a vida mostrar o valor real de cada individuo, para o tempo cicatrizar feridas e abrir outras, a do arrependimento, por exemplo.
A gente tem o hábito de dar força para a amiga triste ou/e braba dizendo: “Nada como um dia depois do outro”. E a amiga certamente pensa: “Frase feita, sempre me dizem isso, mas a intenção é boa”. E assim, a gente ignora a verdade implícita nas frases feitas. Mas o tempo mostra quão verdadeiras elas podem ser.
Por trás da obviedade, esta a verdade, por mais que desejemos criticar, por mais que às vezes nosso humor ruim nos faça ignorar a força da veracidade implícita nelas (nas frases feitas). Nada como um dia depois do outro para nos mostrar isso.
Hoje a gente chora. Amanha a gente ri. Depois do amanha a gente ri, chora e grita. A graça da vida são as emoções que ela nos propicia. Triste mesmo é não sentir emoção, é nunca se sentir um pouco “depre”, é nunca se sentir exaltado, animado. É não sentir o pulsar da vida e a inconstância dos sentimentos que ela nos propicia.
Hoje amamos, amanha ignoramos, depois do amanha esquecemos. Hoje nos importamos, sentimos mágoa, sentimos tristeza. Hoje queremos corrigir as injustiças, as concepções erradas e os julgamentos injustos que fazem de nós. Amanha amadurecemos, nos fortificamos, e não nos importamos.
Hoje o pensar do outro nos fere e nos avilta o espírito. Amanha ignoramos, amanha não nos importamos com a ideia que faz de nós quem não nos estima, valoriza ou ama. Que se “exploda” quem não nos preza e suas idéias que não nos dizem respeito!
Não nos dizem respeito porque erradas, e de errado basta o governo, o SUS e a “bundalização”. De errado basta a ignorância, a desigualdade social, a corrupção, a ganância interesseira e a futilidade. De errado bastam 80% das coisas materiais do mundo.
Nada como um dia depois do outro e uma noite no meio, já dizia uma amiga minha. Um dia para viver, sentir, sofrer e aprender e uma noite para descansar, colocar as idéias em ordem, ou, simplesmente ver gente e o fluir banal de muitas festas.
Nada como aprender a se importar menos com o que não nos agrada e com quem não nos ama. Nada como um dia depois do outro para esquecer do que outrora foi importante, para mudar de portos, de ares, de valores e de amores. Nada como um dia depois do outro para aprender a amar, a conhecer quem merece nossa confiança e amor.

Cláudia de Marchi

(Em alguma noite antes de novembro de 2006).

Conviver é transigir.

Conviver é transigir

Estava me lembrando de um ótimo livro da Lya Luft chamado "Pensar é transgredir". Pensando na vida e nos relacionamentos humanos pensei numa frase que, coincidentemente, rima com aquele título: conviver é transigir. As pessoas intransigentes podem chegar a obter algum êxito na vida, mas, dificilmente serão bem quistas e terão relacionamentos harmônicos.
Ninguém gosta do "mané" que briga com todo mundo que não concorda com ele, que não consegue ouvir uma história sem dizer em alto e bom tom: "Eu discordo, não é bem assim..." passando a expor suas idéias pseudo-corretas sem pestanejar não deixando o outro dizer o que pensa, ou, caso o ouça acaba usando uma forma grosseira de expressão para "ganhar" a razão do que nem sequer deveria se transformar em discussão.
Razão! Este é o objetivo do intransigente, daquele que não consegue se colocar no lugar do outro, tampouco admitir que pode errar, que não é a pessoa mais justa e correta do planeta portadora das "crenças ideais". Ele sempre acha que tem razão, jamais cede, jamais releva. Ou melhor, ele "cede" controlando (um pouco) seu gênio agitado e pueril quando o "interlocutor" desiste de argumentar. Ele ganha sua "luta" imaginária pela razão estafando quem com ele dialoga.
O sucesso de todas as relações interpessoais esta na transigência, na capacidade de compreender o outro, de aceitar o pensamento alheio sem presunção. A base da democracia esta no fato do homem poder transigir, tolerar. Obviamente a intolerância permeia o mundo motivo pelo qual vivemos, desde sempre, com a impressão de que "alguma coisa esta fora da ordem".
Pessoas de crenças diferentes não se toleram, indivíduos com gostos e preferências diversas brigam, casamentos terminam, domingos em jogos de futebol se tornaram uma aventura diante das brigas estúpidas entre torcidas. A existência da diferença em todos os aspectos da vida humana é uma das grandes certezas, mas a efetivação da transigência como algo capaz de fazer a humanidade viver em harmonia é um sonho cuja realização não tem data marcada.
Pois bem, conviver é transigir! Ora, mas as pessoas não "convivem" diariamente? Não, as pessoas vivem perto umas das outras, no trabalho, na família, na cama com seus parceiros, numa junção com os amigos. Poucos convivem realmente porque poucos são capazes de discordar sem serem estúpidos, de opinarem sem brigar, de ouvirem sem magoar ao outro ou a seu próprio orgulho. Quem o faz sabe conviver e interagir de forma civilizada e harmônica.


Cláudia de Marchi 

Passo Fundo/RS, 02 de fevereiro de 2006.

quarta-feira, 28 de março de 2007

A graça na vida.

A graça na vida.

Como existem pessoas entendiantes neste mundo! Criaturas sem graça, insossas, sem gosto, sem sabor, sem cor, tipo sopa de hospital para doente cardíaco e hipertenso. Por incrível que pareça a maioria das pessoas são, ou melhor, estão assim.
É difícil encontrar uma pessoa que brilhe sem fazer alarde, animada sem ser ansiosa (bipolar), simpática sem ser “puxa-saco”, educada sem ser hipócrita, agradável sem ser falsa, cômica sem ser tola, sarcástica sem ser grosseira. A regra é a total falta de graça que programinha de humor de quinta-categoria supre a falta.
Acho que o mundo esta ficando meio sem graça mesmo (nem comédias realmente cômicas estão conseguindo criar). É muito problema, muita desilusão. Governo corrupto, povo indolente e passivo. Mulheres perdidas, pouca auto-estima, homens solitários querendo pintar quadro de “garanhões felizardos”.
A vida segue e a graça vai se perdendo. Falta humor, jovialidade de espírito com responsabilidade e maturidade. Quanto mais os valores se esvaem pelo ralo da carência e hipocrisia mais a graça, o brilho e a luz da felicidade genuína, somem, findam.
Não é a vida que não tem graça são as pessoas que estão lhe perdendo. Perdendo ambas: a graciosidade e a vida. A vida em si é um presente apaixonante, uma escola de imensurável valor, coerente até mesmo na redundância, lógica na ilógica - só quem vive um dia após o outro sente a grandiosidade graciosa da vida.
Ausência de graça combina com “desgraça”, graça combina com risos, lágrimas de frustração sucedidas por riso de perdão, de compreensão e entusiasmo. O riso daquele que vive, erra e aprende.
Todavia nem todos estão no mundo sentindo a graça da sua vida na sua existência. A maioria, amorfa, cruza os braços, finge que é feliz, que tudo esta bem. Não tem luz, não tem humor, tem, isto sim, barriga para empurrar o próprio viver.

Cláudia de Marchi 

Concórdia/SC, 30 de novembro de 2006.

Amores maduros para pessoas maduras.

Amores maduros para pessoas maduras.

Não é difícil mudar. Basta querer. Mudanças são necessárias, no entanto precisam ser desejadas e, para que se concretizem se faz necessária a paciência. Querer mudar é metade do caminho, o resto o tempo e as atitudes se encarregam de operar.
Sabemos o que precisamos mudar em nós mesmos, sabemos das mudanças que nossa vida exige para que sejamos mais prósperos, mais felizes, mais saudáveis, mais tranquilos. Todavia, não é para todos que chegou o momento de reconhecer a necessidade de mudança.
Quando acontece o momento em que há a percepção do que precisamos mudar metade da estrada a percorrer já foi andada. A outra, porém, precisa de exercício, de paciência, precisa, portanto, do decurso do tempo, dos dias e da superação das provações que a vida nos impõe para testar nossa vontade de evoluir.
A vida é feita de fases. Fases e suas superações. Existe a fase da expansão, da introspecção, a fase do encontro com os outros, a fase do encontro com “aquele outro”, e, a mais especial de todas: a fase do encontro conosco, com nosso interior.
A fase da auto-descoberta em que percebemos quem somos, como somos, e passamos a aceitar a nós mesmos bem como a necessidade que temos de nos auto-modificar para evoluirmos na vida. Esta é a fase em que o ser humano, realmente começa a amadurecer.
Apenas após esta fase é que o homem se torna apto a se relacionar, a conviver, e a amar com maturidade. Sim, porque existem amores imaturos. Amores dependentes, amores que não vivem ser respirar o mesmo ar que o outro, amores que precisam do sorriso do amado para sentir em si a alegria. Amores tolos, infantis, e, muitas vezes, amores carentes, amores convalescidos.
O amor maduro é o daqueles que se auto-conhecem, que se auto-compreendem e que se aceitam como são. O amor maduro é paciente, é compreensivo sem ser passivo. É feliz sozinho, é feliz acompanhado, é tranqüilo em si mesmo, mas enfrenta com altivez as dificuldades e artimanhas da vida. Amores maduros para pessoas maduras. Esta é a regra.

Concórdia/SC, 14 de fevereiro de 2007.

Cláudia de Marchi

Casar ou não: eis a ilusão.

Casar ou não casar, eis a questão? Ou seria melhor a afirmativa: “assinar ou não um papel, eis a ilusão”? Cada um na sua, mas com alguma coisa em comum. (Realmente, eu adoro essa frase!).
Cada pessoa com seus sonhos, com suas metas e objetivos escondidos no recôndito de sua alma. Ilusões, sonhos, desejos, todos tem em comum a existência de “algo” educacional, enfim, de alguma influência do legado de nossa educação e, inclusive dos dogmas que nossos pais inseriram em nossa forma de ver o mundo, os sentimentos e os relacionamentos humanos.
Casamento, igreja, padre, vestido branco e juras de amor. “Papel passado”, coisa linda! Não estou criticando, apenas deixo claro que amor, felicidade e união duradoura não necessitam destas cerimônias.
Ora, mas se ele quer casar de papel passado é porque me ama, porque eu sou especial.”. Sim, mas se ele quiser compartilhar seus dias ao seu lado sem estes detalhes também significa que lhe ama. O amor não reside em atos burocráticos.
Afinal, a festa de casamento e todas suas pompas, a cerimônia, o padre e o juiz de paz são encargos baratos se comparados ao ônus do convívio diário, do compartilhar a cama, a mesa e, se não “o banho”, ao menos o banheiro.
Tudo é uma questão de ponto de vista. Não sou nenhuma defensora do casamento, pelo contrário, a vida me mostrou que a história de “troca de alianças” tem, muitas vezes, mais uma conotação de direito de propriedade do que de dever de amor: “Agora ele (a) é meu (minha)!”
E esta conotação, em muitos casos entorna o caldo da felicidade e do companheirismo: “Agora ele é meu e eu posso parar de malhar, ficar em casa vendo televisão com camisolão de malha e meias furadas”; “Agora ela é minha e eu posso deixa-la em casa e sair encher a cara (afinal assinamos um papel!)”; “Agora ele é meu e eu posso ter mais dores de cabeça e demonstrar minha TPM”; “Agora ela é minha e não preciso caprichar tanto nas preliminares”, e assim por diante.
Não falo de exceções, de casamentos entre pessoas que valorizam mais a parceria e a cumplicidade do que a “transferência de propriedade pessoal afetiva” (casamento) que nasceu para assegurar ao homem a certeza de fidelidade de sua esposa e de que os filhos que teria com ela seriam seus legitimamente. (Por isso da valorização secular da “virgindade”).
Ora, ora a união estável tem tudo de casamento, menos as pompas bur(r)ocráticas e religiosas. É a união de duas pessoas que se amam e desejam conviver sob o mesmo teto com a intenção de formação familiar (até mesmo porque a formação de uma família nasce da união entre duas pessoas, de sexo oposto - ou não).
Para que complicar então? Quem ama quer ficar junto, quem ama sente falta da pessoa amada, quem ama vive bem e se sente feliz na companhia do outro. Unidos estavelmente ou em matrimônio, o certo é que o amor e a inteligência devem prevalecer sempre, e, em especial, no caso do primeiro vir a se tornar o segundo.
É justamente a falta de papel passado e pompas que faz com que tudo corra bem enquanto não formalizado, porque, infelizmente ainda é forte no inconsciente humano a valorização ao papel e a opinião da sociedade: “Eles são casados, marido e mulher”. Não importa para a sociedade os desaforos que se aguenta, mas o que consta no papel.
E é toda essa hipocrisia que me dá náusea. É a existência, ainda, no imaginário feminino de que o casamento vai mudar tudo, de que serão mais felizes após assinar um papel. As mulheres casam por ilusão, e até mesmo por tolice, os homens para ter a certeza de que aquelas serão “suas”.
O amor, bem, esse pode estar por baixo ou por cima de tudo, mas ele não requer legalismo formal algum, ele se perpetua na paciência para o convívio harmônico, na parceria, na cumplicidade, e na alegria dos casais enamorados que mantém o respeito, o carinho e o diálogo como cernes da relação. 

Cláudia de Marchi

Concórdia/SC, 28 de março de 2007.

Agora.

Agora.

É um fato: a vida passa com uma velocidade espantosa. Os anos vão, as lembranças ficam, as horas passam, o cansaço chega, as alegrias nos alentam o espírito, e os momentos vão passando na medida em que outros vem chegando. Alegrias, lamentos, realizações, tristezas... Enfim, é a vida seguindo sua doce cadência.
Hoje em dia relembro dos meus anos passados e me perco no tempo: tudo parece tão recente, mas, na verdade, são episódios de 10, 15 anos atrás. Chegar aos 25 anos me fez ver que os anos passam e as lembranças aumentam, mas não se tornam vagas.
Recordo-me de um diálogo que ouvi num filme em que um casal se recordava do inicio do relacionamento sendo que, no seu momento presente, estavam em crise, e afirmavam algo do tipo: “A gente se recorda do início quando estamos próximos do fim.”
Talvez seja por isso que as pessoas idosas se recordem tanto de sua juventude e de acontecimentos pretéritos. Recordar, dizem, é viver, na verdade, creio que recordar faz o homem sentir-se vivo, e, muitas vezes, sentir-se importante e especial. Mas viver, realmente é curtir o presente, o momento atual.
Todavia, os anos passam e o que passou em nossa vida não interessa mais a ninguém, apenas à nós mesmos. Podemos escrever nosso nome na história, um dia, porém, se alguém lembrar será apenas dele (do nome) e não de quem realmente fomos, de nossas agruras, de nossos sentimentos, daquilo que só quem nos amou realmente sabe.
Ninguém, jamais irá nos considerar tão importante, apenas nós mesmos e aqueles que nos amaram pelo que fomos (e somos) e não pelo que fizemos na vida. E é por isso que devemos viver focados no presente, pena de passarmos nossos dias imersos em saudosismo daquilo que éramos e realizamos.
Se estivermos vivos é por que ainda somos e temos muito o que fazer, portanto o presente deve ser o instante ideal para empreender. O presente é o momento propício para novas realizações, certamente, com o tempero mais que especial da maturidade, da sapiência de quem viveu, sofreu, sorriu, amou, caiu e aprendeu.
E sempre, enquanto viver, irá gozar a vida, as dores, os amores, irá criar, realizar, e, aprender, crescer e evoluir. Ninguém é perfeito, mas todos estão fadados à perfeição, basta que vejam que a estrada da vida nos conduz ao aprimoramento, basta que tenhamos o espírito humilde para aprender sempre, reclamar eventualmente, e jamais desistirmos!
O presente é o melhor presente, o melhor momento para tudo, em especial para constatarmos o lado bom de tudo que nos ocorre, para sorrirmos e nos rejubilarmos com quem somos, com o que fazemos e possuímos- para sermos felizes, pois. Se em 15 dias faço 25 anos, sei que não tenho mais a ansiedade permanente dos 20, a petulância fantasiada de sapiência dos 15.
Sei do que vivi, da pequena grande história que escrevi, mas sei, também que ainda não tenho a sabedoria que terei daqui a 10 anos! Falta muito, mas não falta tudo. O presente esta perfeito, pelo fato de ser o que tenho em minhas mãos. Do amanha, eu me encarrego, do passado eu me recordo, mas é agora que eu sou feliz.

Cláudia de Marchi

Concórdia/SC, 28 de março de 2007.

Amar e armar.

Amar e armar.

Certa vez escrevi que se relacionar é transigir. E é mais, se relacionar é interagir, é um exercício constante de diálogo, de esclarecimentos de pontos de vistas. Esclarecimentos e não exigências e “cobranças” - ninguém é perfeito para exigir perfeição, mas todos devem querer e buscar a interação (inteirar-se sobre a vida do outro).
Todavia algumas pessoas que, talvez não tenham desenvolvido a paciência (mãe da capacidade de interação) costumam ver em simples argumentos, justificativas e alegações, aquilo que chamam de “cobranças”. Fazem dos relacionamentos afetivos um misto de juizado especial civil e campo de batalha – o que mais vêem é cobranças com parcos resultados e como “defesa” se armam com argumentos ríspidos.
Se relacionar é uma arte. Fazer uma relação dar certo é como pintar uma tela. É preciso paciência, fazer um fundo, imaginar o desenho, cria-lo e, lentamente escolher as cores para pinta-lo. Para tudo, pois é preciso calma e compreensão.
Transigir é respeitar o ponto de vista alheio, é ver a necessidade de diálogo, de conhecimento mútuo onde certos indivíduos afirmam existir cobranças. Uma pessoa madura não cobra a outra - ela deseja o bem, a alegria, e busca formas, ainda que através do diálogo, de reverter eventual situação desagradável. É preciso ser paciente e compreensivo até mesmo para constatar as boas intenções alheias.
Sempre tive uma “tese”: nos relacionamentos ou a gente se entrega e ama, ou se retrai e se arma. Quando a gente se arma passa a ver o outro e suas palavras como “cobranças” e alfinetadas, por outro lado, quando a gente ama e se entrega à pureza de tal sentimento toda a inocência que outrora nos foi roubada revive. Volta, pois a viver lindamente propiciando nossa felicidade.

Cláudia de Marchi

Concórdia/SC, 14 de dezembro de 2006.

Os moralistas.



Os moralistas.

A vida me ensinou a ter medo dos moralistas. Sabe aqueles indivíduos que acham pecado falar de sexo, ser gay, dizer palavrão, usar calça justa, saia curta e tanga na praia? Aqueles que falam mal da vida alheia e dos pecados carnais dos seres humanos? Eu tenho medo deste tipo de gente.
Os moralistas me amedrontam porque moral não se apregoa: ou se têm ou não se têm. E possuir moral e honra não significa ser quietinho, falar pouco, não falar nisso ou naquilo, não fazer isso ou aquilo porque a Igreja, os códigos “sociais implícitos” ou os pais dizem que é “feio”, que é errado.
Quem é muito “cheio” dos “ais”, dos “nojos” e dos “que horror” (com ponto de exclamação no final), é perigoso. Tem algo em si que, de tão reprimido, acabou tornando-se seu dono, enfim, não é santo ou perfeito, apenas tenta aparentar que é. São pessoas perigosas, porque se acostumaram a ser falsas e hipócritas.
Todavia, um dia a máscara cai. E é de tanto ver essas mascaras desabarem e constatar a face imoral dos “moralistas” que eu desenvolvi um misto de medo e asco deles. São pessoas pouco confiáveis que perderam a própria identidade - vivem demonstrando valores que não possuem. São frustrações ambulantes.

Cláudia de Marchi

Concórdia/SC, 10 de janeiro de 2007.


Pessoas e coisas.

Pessoas e coisas

Pessoas não são coisas. Com coisas nós assumimos o dever de cuidado, com pessoas assumimos a obrigação de respeito, a responsabilidade pelos reflexos que nossas ações terão em seu caráter – isso, em especial, em relação àqueles que cativamos e que nos cativaram.
Pessoas podem ser deixadas, podem ficar para trás em nossas vidas, mas não são substituíveis como um objeto. Não substituímos um amor por outro. Existem, inclusive, amores inesquecíveis e que jamais poderão ser “trocados”, amores que viverão eternamente em nossa memória, lembranças que uma amnésia pode levar da consciência sem jamais apagar suas marcas de nossas almas.
Pessoas sentem, seres humanos têm alma. Apenas quem sabe da responsabilidade que precisa ter com seu semelhante se torna um individuo digno. Digno de viver a vida que ganhou e gozar as oportunidades que possui, inclusive, as de mudar, as de escolher um caminho melhor para se viver. Todavia tal responsabilidade é ensinada pelos pais aos filhos.
Aqueles que vêem ao outro como uma coisa não respeitam o sentimento alheio, não tratam ao outro com respeito. É o marido estúpido, o filho mimado que maltrata os próprios pais, é a moça fútil que valoriza mais seu corpo do que as pessoas que lhe prezam.
São também, os marginais que matam crianças, os estupradores, os assassinos, os latrocídas, os velhacos, aqueles que roubam a vida, o coração e o amor do outro para depois lhes abandonar por mero capricho e egocentrismo. Todos esses acham que seres humanos são meros objetos.
Pessoas merecem respeito, merecem afeto, atenção, amor, do instante em que nascem até ao que deixam o mundo. Todavia, aqueles que foram tratados como coisas na infância tendem a tratar os outros como tais na fase adulta. E é ai que começa o perigo. O maltratado aprende a maltratar, o mal amado só a mal amar.
É por estas e outras razões que não basta ter braços, pernas e cérebro para ser uma pessoa. É preciso, desde a concepção, ter sido tratado como um ser dotado de sentimentos e que, inerentemente, carece de amor e carinho, pena de se estar criando seres piores do que coisas, afinal estas não fazem ferem ao outro, não agem, não reagem e pessoas criadas como elas adquirem um “que” de monstruosidade, algo próprio de seres maléficos e impiedosos.
Criar e educar pessoas é responsabilidade dos pais. Talvez por isso eu pense que o aborto “solucione” algo: evita que mães que não desejam ter filhos, deem à luz e criem indivíduos em meio à violência, ao desamor, por não possuírem condições psíquicas e materiais para a maternidade. Afinal, não basta ter ovários e úteros sadios para poder ser mãe - a maternidade requer vocação e esta implica em vontade, aliada a uma mente e condições financeiras saudáveis.
Mas vêm as religiões: “matar é pecado capital”, “a mulher vai para o inferno”, “a mãe esta adquirindo um carma e vai padecer”, etc. Todavia, quem diz que não é pecado ou que não se cria um “carma” ao trazer ao mundo uma pessoa e abortar dela alguns direitos essenciais: o direito de ser desejada, esperada, amada, acarinhada, abraçada e educada em meio a princípios morais, enfim, em lhe tirar o direito de, desde a concepção, ser tratada e cuidada com dignidade, e, portanto de tê-la?
Porém, a “questão” não é aborto, não é o amor, é simplesmente a verdade: pessoas devem ser educadas, devem ser amadas para aprenderem a amar e para que a “coisificação” dos direitos e da vida humana finde, porque, infelizmente, hoje em dia existem muitos seres achando que os outros são coisas. Coisas de pouco valor, o que é ainda mais lamentável.

Concórdia/SC, 14 de fevereiro de 2007.

Cláudia de Marchi