A fé narcisista
Assim como as crianças precisam de "limites", nossos sentimentos, nossos gostos, nossa forma de ser e pensar necessita de moderação sob pena da razão ceder lugar ao exagero cego e tolo, que demonstra quão estúpidos podemos ser. Até mesmo as virtudes dentro de sua nobreza necessitam ser moderadas, posto que tudo o que ultrapassa certo limite torna-se algo problemático. O mesmo ocorre com a fé, com a religiosidade que, em demasia, demonstra a ausência de racionalidade proveniente do pouco auto-conhecimento e estima por si mesmo do individuo.
Em um de seus aforismos Nietzsche diz que é preferível ser muito cético do que muito crédulo. Analisando as condutas dos "crentes" (aqueles que crêem em algo com convicção) percebo que o filósofo não estava errado, pois verifico quão "sem razão" se torna a análise que fazem da vida e suas contingências, a irracionalidade lhes levam a uma visão maniqueísta do mundo, em que, de um lado encontra-se o bem e do outro o mal e que eles, logicamente, encontram-se inseridos no bem, sendo, via de regra, perseguidos pelas maldades alheias. Enfim, passam a crer que todo bem provém de sua "fé" e todo mal é oriundo de outrem, de magias, de existências sobrenaturais, enfim, eles nunca são ruins, os crentes crêem-se perfeitos, ou quase perfeitos, porque são "humildes em sua fé", resignados como um rebanho de ovelhas.
A palavra "religião" significa "re-ligar", re-ligar o homem a Deus, ocorre que a fé irracional, demasiada, exagerada acaba afastando os homens que fazem de sua crença motivo de discussão, pois precisam da concordância de quem lhes cerca, o que demonstra que nada existe de humilde na obstinação religiosa que precisa da concordância e de aplausos alheios. O homem mais sábio que já encarnou nesse mundo- Jesus Cristo, pregava a importância da união, do amor e respeito entre as pessoas não lhes obrigando a crer naquilo que dizia, não impunha sua fé, era brando, pacifico e não irracional e narcisista como certos crentes.
A fé narcisista quando se depara com o espelho conclui: "não existe crença melhor que a minha,fé maior e mais bela, religião mais correta". Eis o orgulho do crente, que tentando se religar a um ente invisível afasta-se de si mesmo, afasta-se de quem lhes cerca imerso em obstinação. A racionalidade esta na auto-análise, na sapiência demonstrada com a consciência de que se alguém é culpado por algo somos nós mesmos, com nossas fraquezas, com nossos pensamentos negativos, que são unicamente nossos, e não provenientes de influências exteriores que, ainda que existam, não iriam nos abater se nós não fossemos defeituosos e fracos.
Humildade é conhecer a si mesmo, humildade é saber de seus defeitos. Coragem é esforçar-se para mudar, sem culpar aos outros, pois corajoso é aquele que se confessa consigo mesmo, que consegue se analisar da mesma forma que analisa aos outros. Auto-questionamento e duvidas, é sinal de racionalidade. Quem em tudo acredita, demonstra que não reflete e como os bois do filme "Abril Despedaçado", terminam repetindo o que lhes foi ordenado e ensinado (porém, pelo que sei, boi não pensa).
Não se encontra na crença o que não se possui no coração, não é sendo devota que uma pessoa se torna melhor, é se auto-analisando que se evolui, não é rezando terços nem se confessando que se é perdoado, não é dando oferendas que se colhe louros ou que se protege contra algo. Basta que saibamos que a força esta dentro de nós, e que, se quisermos cresceremos e seremos mais felizes, desde que saibamos respeitar a nós mesmos e aos outros. Um elo pequeno separa a fé do fanatismo, a humildade do orgulho, o amor próprio do egocentrismo, a loucura da sanidade, e esse elo se chama razão, sem ela até o amor se mostra ensandecido, e a descrença vazia se mostra menos nociva do que a crença dos obstinados que a ela se dedicam para fugirem de si mesmos.
Cláudia de Marchi
Passo Fundo, 17 de outubro de 2005.
Assim como as crianças precisam de "limites", nossos sentimentos, nossos gostos, nossa forma de ser e pensar necessita de moderação sob pena da razão ceder lugar ao exagero cego e tolo, que demonstra quão estúpidos podemos ser. Até mesmo as virtudes dentro de sua nobreza necessitam ser moderadas, posto que tudo o que ultrapassa certo limite torna-se algo problemático. O mesmo ocorre com a fé, com a religiosidade que, em demasia, demonstra a ausência de racionalidade proveniente do pouco auto-conhecimento e estima por si mesmo do individuo.
Em um de seus aforismos Nietzsche diz que é preferível ser muito cético do que muito crédulo. Analisando as condutas dos "crentes" (aqueles que crêem em algo com convicção) percebo que o filósofo não estava errado, pois verifico quão "sem razão" se torna a análise que fazem da vida e suas contingências, a irracionalidade lhes levam a uma visão maniqueísta do mundo, em que, de um lado encontra-se o bem e do outro o mal e que eles, logicamente, encontram-se inseridos no bem, sendo, via de regra, perseguidos pelas maldades alheias. Enfim, passam a crer que todo bem provém de sua "fé" e todo mal é oriundo de outrem, de magias, de existências sobrenaturais, enfim, eles nunca são ruins, os crentes crêem-se perfeitos, ou quase perfeitos, porque são "humildes em sua fé", resignados como um rebanho de ovelhas.
A palavra "religião" significa "re-ligar", re-ligar o homem a Deus, ocorre que a fé irracional, demasiada, exagerada acaba afastando os homens que fazem de sua crença motivo de discussão, pois precisam da concordância de quem lhes cerca, o que demonstra que nada existe de humilde na obstinação religiosa que precisa da concordância e de aplausos alheios. O homem mais sábio que já encarnou nesse mundo- Jesus Cristo, pregava a importância da união, do amor e respeito entre as pessoas não lhes obrigando a crer naquilo que dizia, não impunha sua fé, era brando, pacifico e não irracional e narcisista como certos crentes.
A fé narcisista quando se depara com o espelho conclui: "não existe crença melhor que a minha,fé maior e mais bela, religião mais correta". Eis o orgulho do crente, que tentando se religar a um ente invisível afasta-se de si mesmo, afasta-se de quem lhes cerca imerso em obstinação. A racionalidade esta na auto-análise, na sapiência demonstrada com a consciência de que se alguém é culpado por algo somos nós mesmos, com nossas fraquezas, com nossos pensamentos negativos, que são unicamente nossos, e não provenientes de influências exteriores que, ainda que existam, não iriam nos abater se nós não fossemos defeituosos e fracos.
Humildade é conhecer a si mesmo, humildade é saber de seus defeitos. Coragem é esforçar-se para mudar, sem culpar aos outros, pois corajoso é aquele que se confessa consigo mesmo, que consegue se analisar da mesma forma que analisa aos outros. Auto-questionamento e duvidas, é sinal de racionalidade. Quem em tudo acredita, demonstra que não reflete e como os bois do filme "Abril Despedaçado", terminam repetindo o que lhes foi ordenado e ensinado (porém, pelo que sei, boi não pensa).
Não se encontra na crença o que não se possui no coração, não é sendo devota que uma pessoa se torna melhor, é se auto-analisando que se evolui, não é rezando terços nem se confessando que se é perdoado, não é dando oferendas que se colhe louros ou que se protege contra algo. Basta que saibamos que a força esta dentro de nós, e que, se quisermos cresceremos e seremos mais felizes, desde que saibamos respeitar a nós mesmos e aos outros. Um elo pequeno separa a fé do fanatismo, a humildade do orgulho, o amor próprio do egocentrismo, a loucura da sanidade, e esse elo se chama razão, sem ela até o amor se mostra ensandecido, e a descrença vazia se mostra menos nociva do que a crença dos obstinados que a ela se dedicam para fugirem de si mesmos.
Cláudia de Marchi
Passo Fundo, 17 de outubro de 2005.
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